João pregou ao povo da promessa, e se restringiu à terra da Judeia.
Ele não pregou em
Jerusalém, mas permaneceu no deserto. A razão é óbvia: Deus não iria
aprovar o degenerado
sistema do judaísmo, mas pôs o Seu mensageiro fora do círculo
religioso daqueles dias. O
“deserto” nada mais era do que uma simbologia da esterilidade e
desolação espiritual de Israel.
A mensagem de João era simples e direta: “Arrependei-vos”. Era um
chamamento a Israel
para se julgarem a si mesmos. Era uma palavra que demandava da parte
dos judeus colocar-se no lugar apropriado diante de Deus, confessando os seus pecados. Era
somente dessa forma que se poderia
preparar um povo para o Senhor, o Messias.
O chamado ao arrependimento recebeu um reforço apropriado com um
aviso apropriado: “Arrependei-vos, porque está próximo o Reino dos Céus”.
Repare, “Arrependei-vos” não porque “o Salvador está próximo”, nem porque “O
Deus encarnado já está entre vós”, nem mesmo porque “Uma nova dispensação se iniciou”;
mas porque “o Reino dos Céus está próximo”. O que será que os ouvintes de João entenderam
com essa expressão? Que significado será que esses judeus atribuíram a essas palavras?
É evidente que o Batista não empregou linguagem que os seus ouvintes não
pudessem compreender. E ainda nos dizem que devemos acreditar que João estava,
aqui, apresentando o Cristianismo! É difícil imaginar teoria mais extravagante
e ridícula. Se, ao dizer “O Reino dos Céus”, João queria dizer a dispensação
cristã, então ele se dirigiu a esses ouvintes judeus numa língua desconhecida.
Isso nós afirmamos com cautelosa serenidade: se João ordenou o arrependimento a
seus ouvintes porque a dispensação cristã estava-se iniciando, ele estava zombando
deles, por empregar um termo que não apenas era completamente incompreensível para
eles, mas também totalmente equivocado. Acusar o mensageiro de Deus de fazer
isso quase equivale a cometer um pecado cujo nome preferimos nem mencionar.
Insistimos na pergunta: O que, então, os ouvintes de João entenderam
quando ele disse:
“Arrependei-vos, porque está próximo o Reino dos Céus”? Ao se dirigir
a pessoas que estavam familiarizadas com as Escrituras do Antigo Testamento, só haveria uma
forma de entender as palavras dele, ou seja, que ele estava se referindo ao Reino de que
inúmeras vezes falaram os seus profetas — o Reino Messiânico. Aquilo que haveria de distinguir
o Reino Messiânico de todos os reinos que o precederam era isto: todos os reinos deste mundo eram dominados por Satanás e suas hostes,
enquanto o Reino Messiânico, quando estabelecido, seria o governo dos Céus
sobre a terra.
Surge a questão: por que Israel rejeitou o Reino para o qual o seu
coração estava sendo
preparado? Não significaria o estabelecimento do Reino Messiânico o
fim do domínio romano?
E não era isso o que eles desejavam mais do que a qualquer outra
coisa? Em resposta a isso, há várias coisas que temos de considerar. Em primeiro lugar, é errado
dizer que Israel “recusou” o Reino, porque, na verdade, o Reino em nenhum momento foi “oferecido”
a eles — o Reino, na verdade, foi anunciado ou proclamado. O Reino estava “próximo”
porque o Herdeiro do trono de Davi estava prestes a apresentar-Se a eles.
Em segundo lugar, antes que se pudesse estabelecer o Reino, Israel
teria de se “arrepender”, mas isso, como se sabe muito bem, era exatamente
aquilo que eles, como nação, terminantemente se recusaram a fazer. Em Lucas 7.29,30
lemos: “Todo o povo que o ouviu e até os publicanos reconheceram a justiça de
Deus, tendo sido batizados com o batismo de João; mas os fariseus e os
intérpretes da Lei rejeitaram, quanto a si mesmos, o desígnio de Deus, não
tendo sido batizados por ele”.
Em terceiro lugar, talvez o leitor entenda melhor o que pretendemos
dizer se usarmos a ilustração de uma analogia: o mundo, na atualidade, deseja
ardentemente uma Nova Era. Um milênio de paz e descanso é o grande desiderato
de diplomatas e políticos. Mas eles a querem em seus próprios termos. Desejam
criá-la por seus próprios esforços. Eles não desejam um Milênio instalado pela volta
à terra do Senhor Jesus Cristo. Era exatamente assim com Israel nos dias de
João Batista.
Por Que Quatro Evangelhos? — A. W. Pink